Teresa Silva e sua filha Marina Alice

Teresa Silva e sua filha Marina Alice

Objetivo 6: Água Limpa e Saneamento

“Às vezes a gente fica uma semana sem água na favela”

Nós falamos com uma mulher da Fazendinha, no Rio, sobre a realidade do saneamento na sua favela e o impacto da COVID-19 em sua jovem família 

por Thaís Cavalcante no brasil 
Tradução: DANIEL AVELAR
15 de dezembro de 2020

Teresa Silva, 33, mora com seu marido, Rafael, sua filha de 5 anos, Marina Alice, e sua avó de 86 anos. Vivem na Fazendinha, uma das 14 favelas que compõem o Complexo do Alemão, na zona norte do Rio. Teresa é universitária e trabalhava como professora na creche de sua filha, mas a pandemia mudou tudo. Ela e seu marido (um operador de empilhadeira) ficaram sem emprego e passaram a vender churrasco em uma barraquinha na rua para garantir a renda da família.


Antes mesmo da pandemia, o fornecimento de água em sua favela era irregular. Quando as torneiras secam, Teresa e seus vizinhos ouvem diferentes justificativas da Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro – dizem que há vazamentos nos canos, entre outros problemas. Por conta da má qualidade do serviço, muitos moradores de favelas pagam a taxa social, um valor pequeno para ter água em casa.

Teresa Silva

Todas as fotos de Teresa Silva foram tiradas por Gabriel Loiola

“Quando estou sem água, peço aos vizinhos com o balde”, diz Teresa. “Às vezes a gente fica uma semana sem água, mas normalmente são dois dias por semana com a torneira seca. Quando está sem água aqui, a gente deixa para dar banho na escolinha infantil. O problema é nos finais de semana que não tem aula”.


“Quando muitas casas ficam assim, a vizinhança se organiza para pagar um caminhão que vende água limpa, chamado Caminhão Pipa. O serviço custa cerca de R$ 400, cerca de um terço do salário mínimo. O valor é dividido entre os vizinhos. Sobre a água mineral para consumo, o gasto é individual mesmo”.

Cortes de Água

Em dias de água nos morros do Complexo do Alemão, um dos maiores conjuntos de favelas do Rio, o tempo é precioso. Teresa se apressa para lavar todas as roupas sujas da família, pois não sabe quando terá novamente essa chance.


Ela conta com uma área exclusiva nos fundos da casa, que tem dois quartos, para lavar as roupas da família (com a ajuda de um tanque elétrico e de suas próprias mãos). Mas quando tem tempestades fortes, a água da chuva alaga o terreno. Teresa lembra que, anos atrás, antes de um muro ser levantado em seu quintal, o que inundava o local era o esgoto que descia da vizinhança, localizada em uma encosta.

Teresa Silva e sua filha Marina Alice

Quando as torneiras de sua casa funcionam, Teresa guarda a água em dois galões de 200 litros cada e em muitos baldes. Não serve só para lavar roupas, mas para todas as outras necessidades básicas, como tomar banho e fazer comida. A divisão é bem racionada e precisa durar vários dias.


Outra alternativa para Teresa é descer o morro com a roupa nos braços para lavar na casa de sua filha de criação, que mora na parte baixa do Complexo do Alemão a 1,2 quilômetro de distância. Ela aproveita as viagens para encher pequenos galões de água reserva para não passar dificuldade.

De acordo com o Mapeamento da Desigualdade 2020 feito pela rede de políticas públicas Casa Fluminense, apenas 63% dos moradores do Rio têm esgoto coletado e tratado. A água da torneira não é potável em muitas partes do Brasil, especialmente nas favelas, então os moradores precisam usar um filtro ou comprar galões de água mineral, como faz Teresa.

Lavagem de Mãos e a COVID-19

Além de precisar lidar com esses problemas, a família Silva foi pega de surpresa pela COVID-19. Teresa e seu marido tiveram todos os sintomas e seu primo também. Buscaram formas de fazer o teste gratuitamente, ficaram na lista de espera, mas não conseguiram. Neste período, o casal se isolou da avó, que ficava em um quarto a maior parte do tempo. Todos os vizinhos dela passaram por situações parecidas ao tentar praticar o isolamento em espaços pequenos.

Nossa jornalista Thais Cavalcante, que também mora em uma favela no Rio

Nossa jornalista Thais Cavalcante, que mora em uma favela no Rio

Fotografia por Gabriel Loiola

Quando a pandemia estava no auge, a maioria de nós, moradores de favelas, sabíamos dos cuidados principais para evitar a contaminação com a COVID-19: limpar as mãos – com álcool gel ou água e sabão; ficar em casa de quarentena; usar máscara de proteção; entre outras necessidades. Os comunicados circularam pelas ruas nos carros de som, foram colocadas faixas nas lojas principais com dicas de cuidado, e nas redes sociais foram feitas publicações sobre o tema.

O problema central nas favelas foi o agravamento da falta de direitos básicos – a falta de água para lavar as mãos e a necessidade de trabalhar, que nos forçou a sair de casa e ir a espaços públicos lotados. Todos esses fatores contribuíram para nos deixar mais vulneráveis ao vírus. Depois de mais de 160 anos da vida nas favelas, continuamos lutando pelas mesmas questões. Agora, em uma pandemia, de forma mais intensa. 

Uma Negação Política

O presidente Bolsonaro praticou o negacionismo da pandemia, tratando-a como “gripezinha” e “histeria” – e seus apoiadores agiram da mesma forma imediatamente. Nas favelas, o uso da máscara diminuiu no dia seguinte de um de seus discursos passados na televisão. O presidente também circulou em locais públicos sem máscara de proteção e indicou para os brasileiros medicamentos não comprovados. Meses depois, Bolsonaro pegou COVID-19.

Com a reabertura das atividades, a vida continua na cidade porque a favela desce para trabalhar antes. São empregadas, motoristas de ônibus e garis, que fazem da cidade um espaço mais limpo e funcional. Mas isso não impede o medo que temos de ser contaminados pela COVID-19, que segue infectando os brasileiros, especialmente os favelados. O Brasil é um dos países mais afetados do mundo, com mais de 175 mil mortes provocadas pelo vírus até agora.

De acordo com o levantamento do Painel Unificador Covid-19 nas Favelas do Rio de Janeiro, já são mais de 25 mil casos confirmados de coronavírus nas favelas da cidade. O Conjunto de Favelas da Maré, onde moro, lidera o ranking com quase 2 mil infectados. O mapa é feito por organizações locais, mobilizadores e dados públicos e alerta como o cenário ainda é grave.

Combate à Desigualdade

Paulo Mota Medeiros, epidemiologista especializado em Saúde Coletiva pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, acredita que é essencial combater a desigualdade na cidade.

“Para resolver a crise de saneamento, precisamos primeiro educar melhor nossa população sobre seus direitos. Depois disso, é necessário pressionar o poder público para que a mesma atenção que é dada às áreas elitizadas seja dada à periferia”, ele diz. “Fora isso, a própria elite precisa se conscientizar de que a saúde não é única, é coletiva. Se um bairro da zona sul da cidade possui esgoto e água, mas o morro mais próximo não, todos padecem, pois quem gira os serviços e a economia deste bairro de elite são os trabalhadores que vivem no morro.”
 
As organizações mundiais preocuparam-se com os alertas para higienizar as mãos e manter o distanciamento social. Mas a prioridade nas favelas cariocas tem sido lutar pelos empregos perdidos, sobreviver com pouca renda e enfrentar, de forma mais frequente, a falta de água e saneamento básico. Problemas que já existiam, mas que se agravaram com a pandemia do coronavírus.

A nossa realidade é de muitas pessoas juntas em um pequeno espaço, pouca estrutura dentro das casas e falta de tratamento de esgoto e acesso à água filtrada. Nós sabemos que somos os mais vulneráveis em uma pandemia, mas não vamos parar a luta.

A história da Thaís...

Thais quando criança saltando sobre uma poça de água

Thais perto de sua casa, fotografada por Rio Gandara

“Meus pais tinham que sair e encher baldes com água todas as manhãs”

Na minha casa, localizada no Conjunto de Favelas da Maré, tem água encanada, mas nem sempre foi assim. Meus pais lembram que na década de 80, quando migraram do Nordeste do país para tentar uma vida melhor no Rio de Janeiro, ter direito à água era privilégio de moradores não-favelados.

Todos os dias, às 5h da madrugada, eles tinham que se levantar e caminhar até um cano de água a alguns quarteirões de distância, cada um carregando dois baldes grandes. Eles enfrentavam uma fila para aguardar a sua vez de encher os baldes, com litros divididos para todos os vizinhos.

Meu pai comprou uma casa de madeira, a demoliu e construiu uma casa de alvenaria no lugar. No começo, tinham apenas uma privada sem descarga colocada sobre uma fossa, sem encanamento. Como o resto da nossa casa, não havia acesso à água corrente. Quando eu nasci, em 1994, já tínhamos encanamento e um vaso sanitário com descarga. A água de torneira não é potável no Rio, então usamos filtros para evitar a contaminação.

Meus pais me disseram que os moradores da Maré tiveram que se unir para superar essas dificuldades ao longo dos anos, e por meio da mobilização comunitária finalmente conquistaram o acesso a direitos humanos básicos como água encanada e banheiros seguros. Por isso, meus pais valorizam muito mais o acesso à água livre nas torneiras e no chuveiro hoje. O que ainda não chega para muitas famílias como deveria.

Nova estação de higiene da #TOGETHERBAND e da Harpic

Nova estação de higiene da #TOGETHERBAND e da Harpic

JUNTE-SE AGORA AO COMPROMISSO “JUNTOS PELA SAÚDE”, POR ÁGUA LIMPA E SANEAMENTO

A Harpic vem desenvolvendo um trabalho incrível para proteger as comunidades mais vulneráveis do mundo da COVID-19. A Harpic recentemente distribuiu 450 toneladas de água engarrafada para meio milhão de pessoas no Brasil, além de 25 mil produtos de limpeza de banheiros e 75 mil máscaras de pano para frear o contágio da doença.

Para continuar esse trabalho vital, a Harpic e a #TOGETHERBAND estão instalando cinco estações de higienização em algumas das comunidades mais vulneráveis do Brasil, promovendo o acesso duradouro à água corrente e ajudando a mudar vidas no processo. Nosso objetivo é garantir que o máximo possível de pessoas possam ter mãos limpas, casas limpas e água limpa. Pedimos que você apoie nosso compromisso por água limpa e saneamento a fim de providenciar os meios tão necessário para fazer o nosso trabalho acontecer. Você pode doar aqui.